Abrindo de manhã a janela do quarto, o nevoeiro subia lentamente das águas frias da barragem; Aquilino conhecia aquela terra melhor que ninguém: terra dura, da pedra e da vida, enrijecendo os corpos e as almas. Uma terra onde, com os dentes serrados, se fala de cogumelos, castanhas e, caminhando para norte, do Douro.
Depois de um pequeno almoço reforçado com queijos, presunto, compotas caseiras, segui viagem rumo à Lapa.
No alto de Sernancelhe, um santuário do que remonta ao Sec. XV, edificado da rocha com rocha, protege a imagem da Virgem Maria, datada do Séc. IX. Conta a lenda que uma menina muda, entrando numa gruta, encontrou a imagem escondida por religiosas, cinco séculos antes. A sua devoção foi tal que a Virgem deu-lhe o dom da fala.
Um edifício cobre a gruta, alberga a imagem e um crocodilo. Sim, um crocodilo! Depois surgiram outras construções, como um colégio. Ao Domingo a venda de produtos regionais é motivo de romaria.
De lendas vive aquela região e eu juro que comigo ficam os segredos lá passados; lendas ou não.
Depois da fonte das três bicas e de ver a nascente do Rio Vouga, o caminho de infância continuou: Penedono.
Na estrada estreita, ainda antes da Beselga, olhando para o alto já se vê o esguio castelo.
Datado do Sec. X, disputado por cristãos e muçulmanos, foi depois aproveitado por D. Sancho I para proceder ao repovoamento da região, na altura fronteiriça, através de Foral.
De xisto e granito, despido, com a excêntrica forma de trapézio e com ameias piramidais, lá no alto da vila medieval, vê-se a imensidão das Terras do Demo e a Corga, para meu regalo.
De Penedono o destino foi para norte, até à Pesqueira.
Gente antiga, olhares de soslaio para com os estranhos mas a simpatia natural que surge com com o primeiro bom dia.
Depois do repasto, foi tempo de ir até ao Alto Douro Vinhateiro, descendo até Pinhão.
Da ponte de ferro, tão característica na nossa paisagem pós revolução industrial, vê-se o Douro e o Pinhão a abraçarem-se: um forte e outro mais fraco mas sempre juntos, mantendo um equilíbrio perfeito e uma harmonia com a pequena vila do Séc. XIX.
Com o sol a baixar e a viagem a chegar ao fim, foi tempo de percorrer a bela N222 até à Régua, ao coração do Vinho do Porto.
Dois dias pela Beira Alta, aproveitando um fim-de-semana e ponte antes do feriado. Dois dias de regresso à meninice e infância. Dois dias que podiam ter sido de sonho, caso não os tivesse vivido.
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