quarta-feira, 7 de agosto de 2019

1.8.19 - Chão da Velha | Bemposta | Foros de Arão | Bucelas | Cabo da Roca | Guincho | Sintra

O Chão da Velha é uma aldeia que é uma rua de casas bainxinhas e que descem até ao Tejo. É simpática, calma e todos se conhecem pelo nome ou pela família. É assim desde que lá vou e espero que o seja durante muito tempo.
Por isso, não foi com estranheza que me viram chegar de moto"cheia de pinta" e, logo de manhã cedinho, me viram partir em direcção aos montes que, juntamente com o rio, fazem a fronteira entre o Alentejo e a Beira Baixa.
Nisa, Gavião e Abrantes, três concelhos enormes por onde já andei rápido - muito rápido mesmo! - nas provas da Ferraria e Portalegre. Desta vez fui mais lento e apreciei a paisagem: a fauna e a flora. Além de cegonhas, uma raposinha correu de uma ponta a outra da estrada.
Até à Bemposta, nada de novo mas depois, entrando na zona de Foros do Arrão, a estrada era virgem para mim e deu muito gozo de condução. Primeiro pela planície e depois por curvas encadeadas antes de chegar a Montargil.
Afinal também já tinha andado por ali, com o Diogo, o Pedro, o Márcio e o Armindo, num Adventure Days. Não naquelas estradas, mas a memória avivou-se.
Montargil, Couço, Coruche, Infantado, Vila Franca. N251, N119, N10.
Cruzando o Tejo, subi a serra verde de vinhas, em direcção a Bucelas e ao seu centro que honra a tradição vinícula da região.
Daí segui para Sintra, para o último Parque Natural da viagem.
Segui para ocidente, para o ponto mais a oeste da Europa; mas, pelo místicismo da floresta e dos palácios, parecia uma viagem para onde nasce o sol.
O Cabo da Roca estava cheio de turistas mas a foto era obrigatória.
Mas do Guincho, fiz o último pedacinho em terra batida, subi ao marco geodésico, para tirar uma foto fantástica, uma boa chapa!
Três dias, mais de 1.000 km, numa moto fantástica para uma viagem nas calmas, a apreciar a paisagem, a conhecer novas pessoas e culturas. Gostei!


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terça-feira, 6 de agosto de 2019

31.7.19 - Alcoutim | Vila Verde de Ficalho | Barrancos | Olivenza | Elvas | Alegrete | S.Mamede | Marvão | Chão da Velha

O dia mais lono da viagem: traçar uma linha o mais recta possível entre Alcoutim e o Chão da Velha, para me levar do Parque Natural do Guadiana ao Parque Natural da Serra de São Mamede.
Mal o sol começou a subir, também eu subi a encosta de terra batida que liga a Pousada da Juventude de Alcoutim ao Castelo Velho. Um pouco de emoção e a terra a aparecer nos espelho da mota, um nuvem que sobe no ar e me faz sonhar com outras paragens e outros andamentos.
Alcançada a N265, encontrei um parceiro que quis medir o musculo da Royal Enfield. Estrada fora, com o patim a roçar muitas vezes o asfalto nas curvas para Mértola, o motor 400 e a ciclistica não me deixaram ficar nada mal perante uma 750 bem mais vocacionada para o asfalto. Cumprimentamo-nos no semáforo da ponte de Mértola e ele seguiu a sua viagem até Lisboa e eu tinha o azimute para Vila Verde de Ficalho.
As azinheiras e o Guadiana ficaram para trás e, empurrado pelo suão quente, chegava a Vila Verde de Ficalho para, de seguida, continuar para norte em direcção a Safara e Barrancos, Entretanto cantarolava:

Subi à serra da adiça
E só parei no talefe
A lua alegre e roliça
Aumentava o tefe tefe
Levei a saca de estopa
Preparado para caçar
Faço dela a minha roupa
Se o frio da noite apertar
O teu coração parece
Uma pedra sem destino
Dizem que só amolece
Ao canto de um gambozino
Uns dizem que é fugidio
Os outros que é de má raça
Tenho de ter algum brio
Para não espantar a caça

Assim me fiz caçador
Sem espingarda nem "piloto"
Para ter o teu amor
Para te cair no goto

As coisas que a gente faz
A dar vazão ao que sente
Já pensava em vir pra trás
Sai-me um vulto pela frente
Abri a boca da saca
Fechei os olhos ao medo
A tua mão não me escapa
Não é tarde nem é cedo

E entrei no Alentejo das grandes planícies, do montado, do touro e do cavalo. Os ares de Espanha, a raia, o contrabando. Fui a Barrancos levado pelo sabor do presunto mas com o calor a apertar (e muito!), fui aconselhado a não levar a bela viola de porco preto na moto.
Então, sem presunto, continuei para norte, cruzei a fronteira e fui até Olivenza ver as nossas propriedades emprestadas ao Rei de Espanha e, com a larica de quem já andava em viagem há horas, voltei a enrolar o punho até à Ponte de Ajuda e segui em direcção a Elvas e ao El Cristo.
Um barco de mariscos era para duas pessoas e eu tive vergonha de pedir um só para mim. Eram camarões, santola, percebes, e muito mais coisas perfeitamente ordenados numa espécie de traineira que nunca viajou pelo Guadiana. Dada a vergonha, pedi quase tudo o que vinha no barco.. mas separadamente! Foi um almoço que domorou horas e soube muito bem.
Em criança fui muitas vezes a Elvas, terra de "contrabandista de amor e saudade", e foi bom ver como a cidade evoluí. O imponente aqueduto foi o cenário perfeito para a foto.
Sem mais demoras, fui para o Parque Natural de São Mamede. A terra branca tornou-se escura e a paisagem mudou depois de Alegre. O pinheiro, o carvalho e o castanheiro dominam a paisagem do ponto mais alto do sul de Portugal. Do alto de S.Mamede vi Portalegre e o Marvão, o destino seguinte.
Mas a grande supresa veio na estrada de Marvão para o Chão da Velha, passando por Nisa, como é obvio. Em vez de seguir por Castelo de Vide e a judiaria, fiz-me ao caminho por uma estrada de gado.
O sol estava a desaparecer no horizonte e pude ver centenas de aves, cavalos, um boi que me impunha muito respeito - e, quando o ultrapassei, percebi que o pobre animal tinha apenas medo de mim - e dois veados. Um bebé e outro ainda jovem mas de grande porte.
Senti-me agradecido e não consegui evitar uma lágrima a escorrer pelo rosto.
Não tirei foto; não cosegui. Está gravado na memória.

domingo, 4 de agosto de 2019

30.7.19 - Sintra | Alcácer | Alcaçovas | Alqueva | Pulo do Lobo | São Domingos | Mértola | Alcoutim


Com Royal Enfield escrito na lateral da moto – um aspecto retro que transporta o heritage da marca britânica, o depósito com uma pintura camuflada de cinza -, senti-me um T.E.Lawrence ou o Steve Mcqueen. Encarnei o a personagem e a Oscar by Alpinestars encarregou-se do look. 
Sintra foi o início e o fim da viagem, uma das pontas de um triângulo que desenhei no mapa de Portugal. Mas por agora, Sintra foi só o local de recolha da moto e, até Alcácer do Sal, não há nada a referir porque foram 120 km  de autoestrada.

Assim, de Alcácer tracei uma linha recta directa ao Alqueva: Alcáçovas, Viana do Alentejo e Portel. 
Como já tinha comprado um chocalho em Alcáçovas quando, há anos, fiz a N2, a ideia era não parar... mas fi-lo mesmo à saída da Vila com o badalo mais conhecido, porque vi um mural pintado por crianças, onde se vêm os heróis da revolução: o povo e o MFA de braço dado. Tinha que ficar com o registo!
A Endfield, é uma moto com motor qb para aquilo que foi concebida - por comparação grosseira, poderia dizer que se fosse um automóvel era um dos novos SUV citadinos -, muito ágil e fácil de manobrar. 
A fundo, por planícies cobertas de trigo e vacas, ia cantarolando músicas dos Rio Grande. Jorge Palma, Rui Veloso, Vitorino, João Gil e Tim. Um projecto musical dos meus anos 90, da minha juventude, onde o Alentejo era o pano de fundo às letras do João Monge. 
Voltando à condução - com o tempo de cantorias já tinha chegado ao Alqueva! -, no grande lago revi alguns percursos da minha estreia no Adventure Days, e andei algus quilómetros fora de estrada a acompanhar o manto de água; estava quente e convidou a um mergulho antes de almoço! 
A barragem do Alqueva mudou a paisagem e mudou a economia do Alentejo: onde outrora estavam campos secos, hoje florescem oliveiras e oliveiras e oliveiras.
Cruzei Serpa e o termómetro marcava 42º.
No Pulo do Lobo também. Mas depois de me deliciar a conduzir na estrada de terra que nos leva até à fraga esculpida por algum arquitecto do mundo e onde passa o Guadiana, com tamanha emoção por estar sozinho naquele lugar único, enóspito, de tranquilidade, onde a água se aperta por entre as rochas, não era o calor que me iria incomodar. 
Em S.Domingos, constata-se a desertificação do interior ao ver-se as inumeras casas e oficinas abandonadas dos mineiros. Onde estará aquela gente, para onde foram as famílias? 

Entre poços, uma mina inundada de água roxa e grandes ruínas industriais, o local foi o ideal para fotos: uma mistura entre Far West do Trinitá a revolução industrial.
A viagem para a ponta sul do meu triângulo mostra como foi importante a presença dos árabes no sul da Península. Ficaram os nomes,
tradições, técnicas de regadio, sabores, temperos. Será uma tajine assim tão diferente de uma cataplana?
O Parque Natural do Guadiana eleva-se de Serpa até Alcoutim e eleva o nivel de condução e de misticismo da viagem.