domingo, 21 de agosto de 2016

20.8.16 - Posada de Váldeon | Leon | Benavente | França | Montesinho | Oliveira de Azeméis

Posada de Váldeon tem o seu q de castiço: depois de vos escrever fui para o "café central" petiscar e beber vinho tinto a copo.
Ninguém estava para grandes conversas porque s grupos estavam feitos: montanhistas, locais e dois ou três casais. Mesmo assim, estava cheio.
Dei por mim a ver TV, meia final de basquetebol, EUA-Espanha, com o EUA, claramente, a dominarem o jogo dando escassas oportunidades aos espanhóis de se aproximarem no marcador, sempre pela marca dos 3 pontos, mas sem nunca se revelarem um perigo. Em perigo estava eu porque deveria ser o único apoiante dos EUA.

O café era familiar: o pai ( que não me lembro se o vi mas devo ter visto para falar dele), a mãe e o filho; um rapaz mais novo do que eu mas ainda mais careca do que eu, a falar muito baixo e de forma incompreensível. Passados segundos viu-se logo quem mandava ali e, às nove e tal da noite, a mãe, a discutir com o rebento, que queria fechar o café às dez e meia e, por isso, para ele fazer qualquer coisa. A partir dali qualquer pedido feito era respondido a contragosto; contudo, naquele local eu compreendo: para que é que eles quereriam vender mais?! Para lucrar mais?! E gastariam esse dinheiro no café do vizinho ou a comprar bastões de caminha, recuerdos de Posada e Caín, e queijo de Cabrales? De facto, mais valia expulsar os clientes e irem dormir.
Posada acordou fria mas com um sol lindo, típico de alta montanha, que me fez recordar dias passados em estâncias de ski.
Penduradas nos cabos de electricidade, milhares de andorinhas davam os bons dias a quem passava.
A etapa era longa - a mais longa da viagem - e, por isso, saí bem cedo.
De Posada voltei a subir aos Picos, para este, indo desembocar em Portilla de la Reina. Pelo meio, indo em busca dos raios de sol que me iam aquecendo, foram mais 30 quilómetros em estrada de montanha, por entre desfiladeiros, subindo e descendo.
À saída de uma curva mais apertada tive a plena noção de como será uma largada de touros, na ordem inversa: entre vacas, bezerros e um boi contei - pela foto - 18 cabeças, que ocupavam a estrada toda. Pelo seu olhar, uns eram mais simpáticos que outros e todos, mesmo os bezerros, com capacidade de me mandarem monte abaixo.
Rapidamente tirei uma foto e com ainda maior velocidade guardei a máquina na Shad do depósito. Depois, a medo, dei duas aceleradelas e fui indo quase a passo ao encontro da mana para ver se conseguia passar pelo meio. Aos poucos e poucos as vaquinhas iam abrindo para eu passar até, quase a chegar ao fim do grupo, poder acelerar calmamente dali para fora.
Pela montanha, uma ave de rapina, lá no alto, acompanhava o meu andamento e, na estrada, às poucas pessoas com quem me ia cruzando levantava a mão.
Saindo dos Picos foi altura de regressar a casa.
Primeiro pela N-621 e 625 até Leon, passando a barragem em Riaño e enregelando os ossos com o frio que se fazia sentir.
Em Leon, antes de  rumar a Benavente pela N-630,  parei para comer um bolo que trouxe do pequeno almoço e, sobretudo, para me aquecer ao sol.
Até Benavente e, posteriormente, até Puebla de Sanabria, a estrada são duas longas rectas, cruzando aldeias e vilas desertas, envoltas de uma paisagem amarela de palha seca, tão característica da Espanha desertificada.
Não se via vivalma, apenas mosquitos que, a mais de 140 km/h iam ficando agarrados ao Nau, dando-lhe tonalidades vermelhas, amarelas e castanhas em cima do branco e da fibra de carbono.
Após Puebla de Sanabria, a poucos quilómetros de Bragança, "Carretera de Montaña" aparece escrito em letras gordas numa placa gasta pelo tempo. Traduzido por miúdos: era hora de diversão. E foi!
Cruzada a fronteira por terras de contrabando,foi tempo de parar em França para uma piada no Instagram e comer duas sandes de presunto que dariam para seis.
Observei o Sabor e subi a Montesinho, por asfalto e por um caminho de terra.
Depois... bem, depois foi tempo de enrolar o punho e descer pela A4 e A41 e A32 até Oliveira de Azeméis, por um país que continua tórrido.
Passei seis dias excelentes,  em cima do meu cavalo preto, a aprender, a viver, na esperança de, um dia, alguém querer ler ou ouvir.
Foram quase 3.500 quilómetros de aventuras, a ver faróis, praias, o mar, a serra, a sentir o sol queimar a cara e a chuva a acalmar os ânimos, e que me deixam com um sorriso franco e aberto, como quem descobre um novo amor.
Agora estou em casa e a vida continua.







sexta-feira, 19 de agosto de 2016

19.8.16 - Fresnos | Covadonga | Sames | Cain | Posada de Valdéon


Lembram-se da comunicação via rádio do Senna para a box no final do G.P. do Brasil de 91? Quando ele ganhou a primeira vez em casa?!
Conduzir nas estradas dos Picos da Europa, traduz-se nessa comunicação. Brutal!
Desfiladeiros estreitíssimos onde torneamos a rocha ou fugimos do riacho que corre lá no fundo do precipício. Miramos as vacas e esperamos que nenhuma dela se lembre de saltar para a nossa frente. Tive orgasmos cerebrais ao pensar como será fazer aquela estrada com um carro giro… o Audi do Ekstron, por exemplo. Perguntei porque é que não há um fotógrafo atrás de cada curva porque, em muitas delas, sei que passei perto do chão e do muro.
De manhã cedo, depois de vos contar as aventuras de ontem, deixei o hotel manhoso lá longe. O primeiro destino seria Covadonga e os seus lagos pelo, que, em vez de ir pela autoestrada, à minha boa maneira, apanhei a N-634 em direcção a Santander para, em Arriondas, seguir pena N-625.
O delírio previu-se na N-634, uma estrada larga mas com curvas de montanha apesar de se rolar ao nível do mar e a N-625 foi aquele sonho que fazem os meus olhos brilharem quando me lembro de cada curva, cada toque no travão ou enrolar o punho para sair em força para o desafio seguinte.
Chegado a Cangas de Onís segui directo ao Santuário de Covadonga, meso a tempo de parar a moto e não apanhar o verdadeiro banho do dia, com o céu a cair-nos em cima da cabeça.
Refeito dessa emoção de deus ao ver-me chegar ali, foi visitar o santuário e a pequena capela esculpida na rocha.
Com a estrada para os lagos encerrada das 20 às 8.30 para veículos não autorizados, restou-me apanhar uma carrinha para subir ao ponto mais alto dos Picos Ocidentais.
Na carrinha tinha como companheiros de viagem três casais – que penso que não se conheciam – mas todos extremamente informados sobre onde estavam, ao que iam e o que andam a fazer neste mundo:
- Há alguma utilidade na água dos lagos?
- Não, é só água!
- Para onde vai o excesso da água?
- Escorre por aquele ribeiro: ali!
Ao mesmo tempo que uma das mulheres gritava sempre que cruzávamos uma vaca, ou um precipício, ou um autocarro ou outra coisa qualquer. O que, numa das míticas chegadas da Vuelta, com inclinações de 15%, precipícios são coisas que não faltam; assim como espaço para cruzar três camiões TIR, um burro e o Bergoglio a sacar piões num Ferrari amarelo. Antes rir.
Chegado ao topo, ao segundo lago, subi a montanha e fiquei a ver os dois lagos e as montanhas que me separavam do mar, dos faróis.
Ouvindo chocalhos ao longe, com a ajuda dos binóculos, observei a neve no glaciar e inspirei.
Antes de descer, daquelas surpresas de viagem: gente conhecida, gente da minha terra, oliveirenses.
Quanto à descida, como podem imaginar, foi idêntica à subida. Com a vertente que estava a morrinhar e na parte final a chover, eu estava cansado e penso que passei pelas brasas, ao som dos espanhóis.
Chegado ao Santuário a chuva acalmou e foi hora de retomar a Cangas de Onís para reabastecer e rumar a sul pela N-625.
Ao cruzar Sames virei à esquerda e subi subi subi subi. Quando já estava cansado de subir, uma placa à direita indicava miradouro. Subi subi subi subi subi, tanto que estava a ver que nem em primeira conseguia transpor a subida, para chegar a um miradouro acima das nuvens.
Tudo o que sobre também desce e engrenei a moto em segunda velocidade e vim por lá baixo a ver se ela travava sozinha. Entrei novamente na estrada principal em Ceneya.
A partir daqui é foi a emoção completa!
Juntem as melhores curvas dos ralis de Monte Carlo, Córsega, Madeira e uma pitada de St. Gallen para Wieldkirch. Está tudo ali. Fazia aquela estrada 20 vezes ao dia e não me cansava, dada a adrenalina e o gozo.
A meio do Desfiladeiro de Beyos, parei para almoçar: canja de galinha e vitela estufada, num restaurantezinho em cima de uma ponte, entre os muros de pedra bruta.
Confortavelmente almoçado, prossegui o caminho, subindo aos poucos até aos 1280 metros de altitude, em Puerto del Pontón, mesmo antes de se voltar a virar à esquerda para entrar no Parque Nacional.
Queria chegar a Cain, ultima aldeia antes da estrada acabar; contudo, antes disso, ao passar Posada de Valdéon tratei de arranjar hotel. Um dois estrelas por trinta euros, com net a funcionar apenas na recepção e quatro euros pelo pequeno-almoço. Há melhor?!
Os nove quilómetros até Cain foram feitos em ritmo de passeio, a apreciar a paisagem, os desfiladeiros, os animais. Marcos de escalada e placas de estrada com inclinações que variam dos 13 aos 20% são vulgares.
Cain é uma pequena aldeia com meia dúzia de casas e albergues, com umas vendas de produtos regionais e algum material (pouco e antiquado) de caminhada.
No regresso, fiz ecoar o escape da moto pelo monte.
No centro de Posada de Valdéon há um ou dois cafés onde está gente que veio até aqui como eu, ou de bicicleta ou a pé e alguns até vieram de carro. Vou até lá, há sempre estórias para ouvir e contar.





18.8.16 - Cariño | Bares | Punta Roncadoira | San Cibran | Ribadeo | Tapia de Casariego | San Agustin | Luarca | Busto | Oviñana | Peñas | Fresnos



Missão cumprida: cheguei à Praia das Catedrais.
Um sol radiante e quente brindou-me com a sua presença o dia todo. Cariño estava bonita e todo o percurso até ao Faro de Bares foi feito a disfrutar a paisagem que oscilava entre promontórios e a Ria de Ortigueira com inúmeras praias de areia branca e mar azul.
No Faro de Bares, junto a umas antigas instalações militares, algumas pessoas ainda pernoitavam nas suas autocaravanas quando lá cheguei.
Com uma cúpula em vidro, o farol é bonito e da Punta Estaca pude ver, à esquerda, o Cabo Ortegal e as eólicas por onde tinha passado ontem. À direita, parte do que se ía desenrolar no dia de hoje: Punta Roncadoira e Cabo San Cibran.
Antes de sair da Punta Estaca, subi por uma estrada estreita a um hotel de montanha. Aí conheci o José Ignácio que, na sua BMW, me disse ter feito várias vezes o Lés-a-Lés. Também de lá do alto vi a Illa Coelleira, entre todos estes cabos, que, segundo consta, albergou oposicionistas a Franco durante a Guerra Civil.
Dali, acompanhando as rias de Barqueiro e de Viveiro, fui à localidade de Faro; subi ao monte, e na descida tomei uma estrada por uma praia de surfistas que me fez chegar ao farol.
Seria meio-dia e um casal francês, com uma bebé, almoçava calmamente. Deu-me a fome e comi um muffin que tinha trazido do pequeno-almoço.
Ao fundo umas gaivotas também deveriam almoçar, dado os voos rasantes que faziam no mar calmo, entre barcos de pescadores e velas.
Dois faróis e a Praia das Catedrais e tinha a viagem que estava planeada dada como terminada.
Primeiro farol, San Cibran: não vão. É feio, horrível, assim como a vila que o alberga. Deverá haver por ali extração de minério ou fundição de alumínio e nota-se isso na paisagem.
A partir de San Cibran terminou o país encantado, com florestas e praias lindíssimas e paisagens que exigem silêncio para as contemplar, de tão belas que são. Dali até Ribadeo, a fronteira da Galiza com as Astúrias, vê-se aquela Espanha que estamos habituados quando cruzamos a fronteira em Valença: casas feias, sem graça nenhuma e uma costa aberta sem montanha por perto.
Apesar disso, antes de Ribadeo, o marco desta viagem: playa de As Catedrais.
É uma praia com a rocha recortada e formando abóbadas como que se se tratassem de catedrais góticas.
Estavam milhares de pessoas e não me fui possível descer ao areal – controlam as entradas por causa da preservação da praia e das marés; e só havia possibilidade de descer ao areal na segunda-feira.
Contudo, do topo, caminhando pela falésia, podemos ver toda a praia e observar os arcos que lhe dão o nome.
Da praia, pela costa, em versão mista de pouco asfalto e nenhum asfalto, fui até ao Farol de Ribadeo.
Último da Galiza para leste, podemos observar o antigo e o novo, ao lado um do outro, num alto de um promontório com um parque de merendas. 
E agora?! 1.000.000 USD question.
Qualquer que fosse a resposta teria que chegar, pelo menos até Gijon.
Mas antes disso, entrando nas Asturias, há que ver faróis asturianos.
O primeiro que aparece é logo ali à frente em Tapia de Casariego. Um farol sem graça nenhuma, igual a outro que vi durante a tarde.
Contudo, não sei se pelo nome italiano da vila ou não, havia ali muito de Positano. Por isso, para meditar na resposta de um milhão de dólares, nada melhor que parar, comer percebes e beber um fino ou dois.
Passei ali parte da tarde a ver os barcos de pesca e a deliciar-me com umas percebes fresquíssimas.
Enquanto pensava sem conseguir ter a resposta correcta, ligou-me um Xavier a falar de algo que ainda não sei bem o que seria. Por isso Xavier, começa a pensar onde vais pagar o jantar de Sábado!
Entrando nas Astúrias voltamos a ver algo diferente: campos com plantações de milho e muitas vacas a pastar no prado; fiquei com a sensação que tive nos Açores: os asturianos vivem do mar ou da agricultura? Certamente dos dois, e tornam a paisagem muito agradável e pacífica.
Embalado pelas percebes e pelas cervejas, segui para o Cabo de San Agustin – lembro-me do nome porque é o mesmo de um baterista do Julio Iglésias, numa música que gosto bastante ( e que não é do Júlio, ele faz apenas e só um cover com um sotaque à Tony Silva).
De San Agustin vê-se o farol de Busto mas, pelo meio, fica o de Luarca: uma bela surpresa.
A seguir para Busto, já sem bateria no telefone para confirmar o GPS e sabendo que deveria seguir duas estradas – N634 e, depois N632 – enganei-me e fui para a outra vila ao melhor estilo italiano, com os barquinhos no mar e a vila a erguer-se por uma escarpa e a estrada em carrocel em torno dela.
Numa curva mais apertada, de frente para o mar, o farol, antigo, indica aos pescadores onde está a porta de casa.
O farol de Busto é tão desinteressante como o de Tapia e, para se chegar até ele, anda-se por uma estrada estreitíssima entre vacarias, onde o cheio a natureza é inigualável.
Oviñana também tem pouco para ver, e fui enfadado para o Cabo de Peñas.
A melhor paisagem para terminar o dia: com o sol a pôr-se, o mar toma tons de dourado e do alto da escarpa em frente ao farol, escalada como se de uma cabra montesa se tratasse, o farol imponente toma conta do golfo da Biscaia. Premonição número um.
Do Cabo Peñas, maravilhado com a paisagem, após uma simpática conversa com um grupo de espanhóis, segui para Gijón.
Dos hotéis de uma a quatro estrelas, não havia uma cama (não encontrei nenhum de cinco estrelas para perguntar).
A melhor opção seria seguir para Oviedo, afastando-me da costa.
A caminho de Oviedo, obras ou um acidente, causame uma fila na estrada e decidi sair para outra estrada em direcção a Santander quando, numas luzes brancas e rosa, vejo um hotel de beira de estrada. É já aqui!
Não tinham quarto. Mas indicaram outro a um quilómetro de distância, ao lado de luses rosa, típico das estradas espanholas.
Assim, às dez da noite, cheguei ao quarto, o mais caro da viagem e o que tem menos qualidade, tendo uns camiões e autocarros à porta e estando a algumas dezenas de quilómetros do mar. Premonição número dois.
Como gastei o dinheiro do jantar no almoço, sentado numa secretária, comi um bacalhau com feijão-frade; delicioso. E sentei-me a escrever.
A resposta à questão “e agora?!” tinha três hipóteses: ou ir directo a casa, ou ir aos Picos, ou tentar chegar a Biarritz fotografando o resto dos faróis.
Estava inclinado para Biarritz e a vontade de voltar a percorrer a belíssima costa basca. Mas são quatrocentos e cinquenta quilómetros, em para arranca para tirar fotos, que, para um dia, iam ser muito complicado.
Com a ocorrência a empurrar-me para dentro, amanhã sigo para os Picos e, depois, para Puebla de Sanábria e entro em Portugal em Bragança.
Por isso Xavier, vai pensando!

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

17.8.16 - Laxe | Punta Nariga | Malpica | Coruña | Mera | Prioriño | Cabo Prior | Meirás | Cedeira | Cariño




Apesar da chuva que me fez trocar o casaco laranja - com o qual me sentia um Mitch das motos - por um preto da linha Tour Tech da Alpinestras, apesar do Manolo, simpatiquíssimo me ter feito atrasar ainda mais a saída de Laxe, apesar de começar a pensar que a N222 não deverá ser a estrada mais bonita do mundo, o dia correu pelo melhor. Estou felicíssimo, instalado num hotel em Cariño.
E porquê?! Vão já perceber porquê; mas penso que ter tirado pela primeira vez a cadeira da embalagem e ter almoçado umas ovas de bacalhau fenomenais, ali quase no virar do Atlântico para o Cantábrico, poderá ter muito a ver com a coisa.
Acordei cedo para escrever o dia de ontem tarde para começar a viajar. Pensava que tinha perdido as chaves da garagem da moto e afinal estavam no bolso de trás das calças. O Manolo, do mais simpático que há, quis tirar fotos comigo e com a moto, fazer um vídeo e ainda me ofereceu uma t-shirt a dizer “ De Puta Madre, Manolo”.
Com tudo isto e a estrada a apresentar aquele visco típico das primeiras chuvas levou-me a pensar “ Zé Carlos faz atenção que isto hoje não vai correr bem”.
De Laxe segui pela estrada para Malpica e, algures a meio, segui por uma estrada no meio de uma aldeia de agricultores em direcção a Punta Nariga. No meio da vegetação rasteira da montanha cortada pelo vento, um farol lindíssimo, em que o arquitecto se preocupou em criar imagens de animais, dependendo do ponto de vista de cada um.
Dali avistei até Punta Roncudo, para sul, e as Ilhas Sisargas, a norte.
Com o vento a estrada começava a secar e até Malpica, rolei sem problema algum. Do alto da Ermida de San Adrian avistei as Ilhas Sisargas mas não consegui vislumbrar o farol. Do outro lado, uma praia de sufistas e a feiura pensada de Malpica, dando um colorido especial à baía.
De Malpica a Coruña tentei ir o mais rápido possível, com estrada boa e seca, para tentar recuperar tempo perdido. Melhor dito melhor feito e foi com satisfação que vi a Torre de Hércules erguer-se no céu, poderosa, como se o interior fossem escadas enormes que expandem as travessas para o exterior.
Tirei fotos na Rosa-dos-ventos e, com os binóculos, observei os faróis de Mera e o Cabo de Prioriño Grande.
Assim, saí da Coruña e fui directo a Mera que, com os binóculos, parecia muito mais perto do que na realidade foi. E o farol também me pareceu mais bonito atrás das lentes!
Quando ouço alguém falar do Ferrol penso na mãe a contar que quando lá foi, em frente À estátua do Franco, lhe diziam “ un caballo em cima de outro caballo”. Pois bem, passei no Ferrol e nem entrei na cidade. A manina da portagem perguntou para onde eu ía e disse-me logo o caminho a tomar e assim fiz.
Ao lado de um enorme porto de asfalteiros fica o Cabo de Prioriño Grande. E foi la que eu disfrutei da paisagem refastelado na minha cadeira, como se de um posto de observação avançada se tratasse. Que bem me soube!
Ali, pela primeira vez, não tinha ninguém a quem perguntar as direcções para Cabo Prior e no mapa não dava para perceber o caminho. Então liguei o GPS – sim, para manter a sanidade mental numa viagem a solo, tento falar com as pessoas e perguntar direcções é uma forma de contacto. Se for sempre a ouvir a mocinha do GPS e não falar, já nem saberia articular palavras.
Do Cabo Prior, com os binóculos, avistei uma agradável surpresa: o farol de Meirás, que não vinha no mapa. Melhor ainda, chegado lá, tinha que fazer uma incursão fora de estrada para melhor capturar o farol na lente da objectiva.
Rumei a Cedeira que deveria ser o último farol do dia. Uma vila lindíssima, como todas por onde tenho passado, e uma estrada de montanha, por uma floresta de pinheiros, abetos e carvalhos que me levou até ao farol.
Na placa pareceu-me ver 1,7 km e eu com a moto na reserva. 4 km no total e teria gasolina. O pior foi que a placa dizia, efectivamente 7,7 km, com uma subida íngreme que me levou a pensar várias vezes: o que vale é que para baixo é a descer.
Chegado ao topo da subida, uma ligeira recta para, depois, um carrossel de curvas até ao mar que desembocavam no portão do farol. Louco!
Pena que desci com a moto desligada para poupar gasolina e ao subir, voltei a rezar a todos os santinhos para que não faltasse nem uma gota. Não faltou!
De novo em Cedeira, com a moto atestada de gasolina e o sol ainda por se pôr, decidi rumar a Cariño para ver o farol do Cabo Ortegal.
Que maravilha, a melhor decisão da viagem: a estrada por onde vim tinha o asfalto perfeito, cabendo carro e meio. Curva contra curva, montanha acima, entre uma floresta digna desse nome o sol a deitar-se lentamente no mar.
Fazer a estrada de Cedeira para Cariño seguindo a rota dos miradouros deveria ser obrigatória: para as pessoas comuns terem o prazer de ver aquelas paisagens.
Para os senhores do Ministério da Agricultura, Ministério da Administração Interna e Ministério da Defesa perceberem como se faz prevenção de incêndios: passei por floresta e por eucaliptais; nos eucaliptais, nestes de hoje ou outros que, escassamente, vi na viagem, havia vestígios de incêndios. Na floresta - de pinheiros, carvalhos, arvores rasteiras, castanheiros – haviam vacas, bois, cavalos, ovelhas e certamente outros animais que não tive o prazer de presenciar. A floresta estava limpa e não havia nenhum vestígio de incêndio. Provavelmente aqui preferem gastar dinheiro com pastores o ano inteiro, em vez de proporcionarem números acrobáticos com aviões russos, canadianos ou de outra qualquer origem, durante o verão.
Com o sol baixinho cheguei ao Cabo Ortegal. Maravilha, como diz um amigo meu.
Estou em Cariño, num simpático hotel com o nome de … Cabo Ortegal.
Vou jantar, vou lavar camisas e decidir o que faço amanhã.






16.8.16 - Sanxenxo | Carreiro | Illa de Arousa | Corrubedo | Muros | Corcubion | Fisterra | Touriñan | Camarinas | Laxe

Quando era adolescente, numa altura onde se formam os nossos valores morais e intelectuais, comecei a ler um livro editado pela Assírio & Alvim que se chama "Hipérion ou O Eremita na Grécia" (1797), de Friedrich Hölderlin (1770 - 1843).
Não o li todo porque a sua escrita poética, germânica tornou-se, a determinada altura, imperceptível para mim. 
No entanto lembro-me das cartas que Hiperion mandava ao seu amigo Belarmino a falar da Grécia: da sua beleza, tranquilidade e liberdade.
O dia de hoje foi assim: visitando locais de uma beleza indescritível, que transmitem uma sensação enorme de paz interior e, quando se viaja de moto, de liberdade e de compromisso.
Apesar de estar em Laxe cansadíssimo após mais 12 horas a andar de moto, algumas vezes perdido, com frio; apesar de não ter conseguido chegar à Corunha; estou felicíssimo. 
Vamos ao relato da viagem!
Sanxenxo acordou cinzenta e a chuva ameaçava aparecer. Apesar disso ainda vesti as calças de ganga e o casaco de verão da Alpinestars. E como disse anteriormente, não quero tirar o resto do saco.
Depois de uma rápida ida ao Lidl para comprar mantimentos para o pequeno almoço e água e sumo para a viagem, segui até à Punta de San Vicenza, à praia de Carreiro, para ver o primeiro farol do dia.
Do lado oposto a O Grove, na mesma península, é necessário fazer uma estrada em terra batida para se ir desembocar numa praia deserta.
Tão deserta que, ao caminhar pela areia, entre as rochas e as águas calmas, junto a uma florestação rasteira, duas lebres ainda bebés corriam à minha frente. 
Ao fundo, numa ilha feita de rochas, um pequeno farol apareceu entre o nevoeiro; ao perto, como se de um altar se tratasse, em plena praia, pequenos montes de pedras encasteladas em cima umas das outras pareciam como figuras humanas.
Daí segui para a Illa de Arousa, sem antes me perder e ter que fazer mais quilómetros, para, na praia do Farol, ver mais um farol, erguido numa pequena casa. ali ao lado, na Ria de Arousa, a faina: dezenas de barcos e mexilhoreios, numa azáfama de quem vive da ria.
Num dos mapas que tenho havia a indicação que em Carril existiria um farol. Fui até lá e não o vi. Pelo caminho, o susto da viagem: em Vilagarcia, apesar de ser quase meio-dia, havia uma festa que deve ter começado no dia anterior: miúdos, aos milhares, completamente ressacados, musica tecno no meio da vila, gente a urinar e a vomitar na via pública, "I will survive" e lantejoulas e flores no cabelo no outro lado e, num para arranca constante, quando acelero, um miúdo com uma camisola da NBA salta para a frente da moto. Travei e a roda da frente escorregou; não fui ao chão mas estava a ver que ele ia ficar preso entre as malas e um carro. Felizmente não aconteceu nada e fiquei com a sensação que se fosse o TGV a passar, para ele seria a mesma coisa: talvez uma bolha de sabão gigante, ou um gafanhoto verde aos saltos! Prossegui viagem a falar da mãe do rapaz.
Acham as Rias Baixas, na zona de Vigo e Pontevedra, bonitas? De facto são. Mas depois de Vilagarcia e fazendo a costa, começa a "Liga dos Campeões": paisagens lindas, intocáveis, com pontes de madeira e gado a pastar por campos verdejantes, entre o atlântico e as montanhas.
Chegar ao Cabo Corrubedo, pela imensidão da paisagem, pela paz que se respira, é como chegar ao paraíso. 
Depois dos vilarejos uma recta leva-nos ao Cabo, de onde, ao longe por entre as lombas, começamos a ver o topo do farol. Do lado esquerdo, num azul caraíbas, a praia dos Baleeiros.
No Cabo Corrubedo sentimos que quem arquitectou o mundo sabia o que fazia: praias lindíssimas, vê-se Muros e Fisterra, lá ao longe.E tudo numa tranquilidade e serenitude impressionantes.
Abandonem-me aqui uma semana e serei um homem novo, pensei!
No meio de tudo aquilo, na recta que liga ao farol, vejo aproximar-se um camião TIR, laranja, a combinar com o meu casaco e os binóculos. Será?! Mandei parar.
- O senhor é de Oliveira de Azeméis.
- Sou sim.
- Eu também sou.
- Da cá um abraço.
E um resto de conversa em que já me tratava por menino. 
Deixei Corrubedo para trás e segui para Noia ( sim pai, finalmente vim a Noia!) para depois continuar até Muros.
Entre o verde da montanha e o azul do mar, respira-se paz. São cenários de TV que passam a minha frente, naquela sensação do Homer Simpson a chegar ao Alasca. São praias de areia branquíssima e dunas enormes. São estradas como o Turini, num zigue zague constante onde o som do motor ecoa pela montanha. Vale a pena vir até aqui, se vale.
Na zona de Muros existem três faróis: Campo de Cortes, Louro e Lariño. o primeiro fica em cima da estrada, como se de uma casa se tratasse e mal se vê.
Louro é paradisíaco e Lariño fica no meio da praia, meio ao abandono, onde se leêm inscrições como " salvem o faro".
Por falar em inscrições, elas existem em todo o lado, pintadas nas ruas e nos muros, com palavras de ordem contra as palavras de ordem unificadoras. Eu acrescento: Galiza para Portugal: já.

Nesta parte da viagem, dada tamanha beleza, pensei várias vezes: descobri uma nova Suíça e muito mais perto de casa: um local onde a floresta beija a água, onde se vêm pinheiros e outras árvores a crescerem com grandiosidade e o seu reflexo faz-se sentir na calma do oceano.
Cheguei a Corcubion e armei-me em Roças: parei a moto numa taberna, levei uma lata de conserva com bacalhau com grão, da Liporfir, e perguntei ao tasqueiro se podia comprar cerveja e pão e eu comia o que tinha. Disse-me que não, que isso iria abrir precedentes com outros clientes. Compreendi. Eram quatro da tarde e num restaurante com vinte mesas estavam três ocupadas. Perguntei, então, o que é que ele tinha para me servir rápido, porque estava com pressa; a resposta foi que não tinha nada a sair porque tinha muitas mesas para atender. E assim pude comer calmamente a delicia vinda de Aveiro.
Depois de almoço, poucos quilómetros me ligavam a um dos pontos altos da viagem: Fisterra.
Que desilusão!
Se tudo o resto é calma e tranquilidade, Fisterra é uma excursão a Fátima ou uma ida à Luz num domingo à tarde. São milhares de pessoas, uma barulheira sem fim, com excursões e famílias inteiras a irem visitar o local de partida de Santiago.
Pensava que ia estrear a minha cadeira em Fisterra. Se o fizesse, estou a ver que teria como companhia alguém com guarda-sol e outros de campingaz e daqui a pouco estava tudo o mundo de jola na mão a discutir futebol como Jorge Jesus ou a últimas da Cristina e do Goucha.
Isso e com o frio que estava, cortou um pouco o dia.
Rapidamente saí de lá e rumei a Touriñan e a mais um farol digno de filme.
Esta é a Costa da Morte, desde Fisterra a Laxe, onde estão contabilizados mais de 1200 naufrágios. Se não fossem os faróis, muitos mais seriam. 
De Touriñan vê-se Cabo Vilan, em Camarinas. Mas o caminho até lá são quase quarenta quilómetros num sobe e desce entre campos de milho e vacas a pastar.
Cabo Vilan é "o farol". Está no topo de um monte, e a sua robustez deve-se sentir até Plymouth.
Laxe foi o último do dia: chegado a Laxe, passa-se por uma rua que faz um túnel por baixo de um restaurante e sobe-se. Lá no alto,  desce-se até ao mar onde um farol branco marca a Costa da Morte.
Procurei um hostal e o único que há é o Bahia.
Quando contei ao dono o que estava a fazer apresentou-se como autor de um site sobre a rota dos faróis e de um livro, o qual mo ofereceu. Além disso, não paguei o parque da moto. Excelente!








segunda-feira, 15 de agosto de 2016

15.8.16 - O.Azeméis | Porto | Leça | Azurara | Vila do Conde | Póvoa | Esposende | Viana | Caminha | Baiona | Vigo | Cangas | Sansenxo

" Há quem goste de procurar Pokémon. Eu prefiro faróis." foi o que escrevi no Instagram no final do primeiro dia de viagem, nesta rota dos faróis.
Foram aproximadamente 400 km em mais de oito horas de viagem, levando o meu cavalo preto pela costa, saboreando a brisa marítima, em busca de faróis.
Freud diria que eu busca algo fálico; eu digo que busco construções extremamente importantes para os viajantes marítimos. Tão importantes que os há fortificados: quem detiver o controlo da costa, poderá utilizá-la para receber barcos ou para os fazer embater, inoperalizando-os. De Alexandria ao Mar do Norte, nos mares do sul ou do Oriente, as histórias e estórias de faróis multiplicam-se.
Posto isto, necessito de muito mais faróis que aqueles que me chegaram a sugerir: uns de um Alfa Romeo 156. Mas isso são outras estórias!
Eram 8 da manhã quando saí de Oliveira de Azeméis, rumo ao farol mais perto de casa, a norte: Foz do Douro. Com um nevoeiro espesso, muita humidade e frio, fui maldizendo a minha vida até ao momento em que tirei a primeira foto, em pleno pontão do molhe norte do Douro. Tinha começado a viagem!
Entrei no Porto pela Ponte do Freixo, desci à marginal e a Foz apareceu-me no correr do rio, ou seja, no sentido contrário ao dos barcos. Antes de chegar ao farol, passei nos farolins da Cantareira e das Sobreiras, assim como o Farol de São Miguel o Anjo.
Entre olhares indiscretos dos pescadores, atónitos pelo aspecto aventureiro da moto, com malas, autocolantes e a cadeira portátil, conduzida por um homem de casaco Alpinestar laranja.
Da Foz rumei a Leça, pela ponte móvel, sem antes cumprimentar o farol da Senhora da Luz, pouco mais à frente do actual farol.
Em Leça o farol impõe-se à paisagem, mesmo com os edifícios a sul e a  Petrogal a norte. É um edifício marcante para as gentes do Porto porque o passeio de domingo pelas praias de Matosinhos implicava uma passagem por ali.
Num percurso inverso ao que tinha realizado há um ano atrás, segui até Vila do Conde. Pelo meio o farol da Azurara, escondido atrás do parque de campismo, no meio da mata, ou, como me disseram,  " é uma coisa velha sem utilidade nenhuma".
É um farol estranho: uma parede vermelha e branca, com o topo triangular, onde contêm a lanterna.
De Vila do Conde, com um trânsito caótico, rumei à Póvoa de Varzim para ver o primeiro ( de uma série) farol ao lado de uma igreja. A fé dos homens do mar vê-se nestes pequenos gestos.
Continuando pelo trânsito veraneante em dia de Nossa Senhora, cheguei a Esposende. Na Foz do Cávado, marcado pelo tempo, uma casa senhorial com um azulejo da época indica o farol e, pelo seu aspecto, a importância que ele terá tido. Dando a volta, umas janelas de alumínio batidas pelo tempo e um estendal de roupa demonstram  algum desmazelo. Uma pena!
De trânsito em trânsito, Viana do Castelo estava engalanada para receber as festas da Nossa Senhora da Agonia. E é na capela da Nossa Senhora da Agonia que podemos encontrar um farol, com a edificação atrás e um pouco mais alta que a torre sineira.
Em frente, no forte junto ao porto, outro farol.
E o terceiro, o de Montedor, na Nacional 13, lá no alto,  faz a triangulação entre Viana e Caminha.
No Ínsua, na foz do Minho, lá na pequena ilha, encontramos o último farol português a norte. Não o visitei porque entre barco e outros preparativos teria pelo menos 3 horas. Assim, ficou para uma próxima viagem.
O ferry em Caminha não opera à Segunda-Feira e, por isso, fui a Cerveira cruzar a ponte para a Espanha. A meio da ponte, na placa da CE que indica a fronteira, azul com as estrelas amarelas e o nome do país ao centro, "Espanha" aparecia riscada e em seu lugar, a pincel, "Galicia". Naquele momento tive a perfeita noção que estava em Espanha!
No porto de A Guarda, junto a todas as marisqueiras onde proliferam portugueses como cogumelos, comprei um cacete e uma cerveja. No seu interior, sentado numas escadas que davam para o azul claro do mar, comi um bacalhau assado da Liporfir. Uma delícia!
De A Guarda até Baiona, num zigue-zague rápido entre a escarpa e o mar, finalmente sem trânsito, diverti-me com a moto.
Ao chegar ao Cabo Silleiro, lá no alto, vigiando o Atlântico. Que imponência!
Até Vigo, mais trânsito e, escondido no meio da vegetação acima da estrada, o farol do Cabo Estai.
Descendo até Bouzas, onde normalmente apanho o barco para ir mergulhar, o farol de Vigo. Simples, um pouco corroído pelo tempo e onde a ferrugem e o vidro lhe dão um ar de instalação artística.
Os grandes faróis de Vigo encontram-se nas Ilhas Ciés, a algumas milhas náuticas para sudoeste da cidade.
Assim, segui pela recortada costa visitando praias onde já mergulhei: Liméns, Aldán.
Lá no alto, seguindo por uma estrada até Cabo Home e, depois, prosseguindo por outra estrada em terra batida até à Punta Sumalvido, em cima das arribas de praias paradisíacas, encontramos três faróis: Cabo Home, Punta Robaleira e Punta Subrido.
Lindo lindo lindo!
Uma vista de cortar a respiração, com as Ciés à esquerda e as Ons à direita.
Saído com a vista cheia de tamanha beleza, foi hora de voltar a tirar prazer da moto: primeiro pela estrada de terra batida. Depois na descida até Aldán e Buéu, levando uma R1 colada ao meu escape.
Com os faróis de Pontevedra instalados na Ilha de Ons, fui aproveitando o pouco sol que restava para fazer quilómetros pela recortada costa galega.
A chegar a Sansenxo, com inúmeras recordações de infância, decidi parar.
No primeiro hotel decido regatear o preço. Nada feito.
No segundo também não tive sucesso mas já só queria um banho e uma cama.
Estou no La Terraza, no centro, edificado em 1917. Quero ver se depois de ter escrito o nome deles aqui se me convidam para a festa do centésimo aniversário!






 

domingo, 14 de agosto de 2016

Levantar âncora

É altura de zarpar, de levantar âncora e de sair à conquista. Viajar e isto mesmo: é viver, é mudar, é sair da zona de conforto - como dizem os livros de auto-ajuda e são repetidos vezes sem conta por esse mundo fora -, é experienciar, é conhecer.
Em grupo, em família, sozinho; com uma viagem extraordinariamente organizada pela Agência Paraíso ou à aventura; de mochila às costas ou com passadeiras rolantes para entrar em sumptuosos hoteis.
Amanhã é o dia!
Depois de marcar e desmarcar vezes sem conta uma viagem de verão, depois de apontar ao norte, ao este e a sul, depois de nada ter, olhei o mapa: Galiza.
Uma costa recortada, carregada de micro praias e uma gastronomia rica em peixe e marisco.
O objectivo é chegar à Praia de Catedrais, percorrendo toda a costa e fotografando todos os faróis que encontrar. Depois; bem, depois poderei seguir até Santander e ir aos Picos. Ou regressar directamente pela Sanábria e visitar Trás-os-Montes.
Sem nada marcado, apenas com a minha bagagem e o depósito cheio, vai ser uma aventura.
Nas malas laterais da moto levo aquilo que espero não utilizar: óleo de motor e de corrente da eni, mala de ferramenta, fato de chuva e botas da Alpinestars e, pela mestria e aconselhamento do meu amigo Rui Baltazar, cintas de amarração e uma garrafa de 1.5 l de água.
No topo, dentro de uma Shad impermeável, a minha roupa - umas camisas de tecido de secagem rápida, duas calças, roupa interior, toalha, calções de banho -, o estojo de higiene, e um saco cama da Monte Campo porque não faço a mínima ideia onde vou pernoitar.
Na Shad do depósito, as maquinas fotográficas, uns binóculos e, para o caso da fome apertar, umas conservas de bacalhau da Liporfir para a merenda - as cañas e o pão arranjo pela viagem;.
Novidade nesta viagem: levo uma cadeira que se enrola num tubinho. Porquê? Bem, se é uma viagem para contemplar paisagem, ver escarpas e arribas, o pôr-do-sol no Golfo da Biscaia, convém estar bem instalado.
Além de tudo isto levo a máscara de mergulho e toda a documentação que me pode permitir mergulhar.
Parto amanhã. Regresso para a semana; mais dia menos dia.
Até lá vejam o blog ou acompanhem no Instagram e Facebook.
 É sempre bom saber que há alguém à escuta.

10.8.16 - Lisboa | Évora | Alcáçovas | Alcácer do Sal | Lisboa

Portugal arde e as imagens da TV chegam até à varanda de casa, com o incêndio de zona de Loures a afogar Lisboa em fumo.
"Que farei quando tudo arde", de Sá de Miranda, de Lobo Antunes, um retrato de um país visto por várias pessoas. Tão actual o título como o conteúdo: as minhas viagens - apesar de não ser filho de um travesti - num país que se consume diariamente num fogo físico, mental, corrupto. Serão as viagens um ponto de partida? Um ponto de fuga? Serão, certamente, uma forma de estar.
Fugindo do fumo de Lisboa cruzei a ponte Vasco da Gama e, ao chegar à outra margem, dezenas de homens debatem-se com a lama para chegar às suas embarcações; a pesca no Tejo, o trabalho dos marnotos do Samouco, a seca do bacalhau, contrasta com a ponte e o pós-moderno Freeport.
Depois da ponte, o caminho é pela lezíria em direcção a Montemor. Pelo meio ficaram Pegões, Vendas Novas e as suas famosissímas bifanas, toiros e cavalos que povoam a paisagem.
Em Montemor conheço o L`and Vineyards, ainda do tempo da Estrela; mas a palavra contenção tem que existir no meu dicionário e, por isso, o castelo ficou para trás e rumei à fortificada Évora.
Com a moto parada entre tantas outras no Giraldo, cada uma com a sua história para contar, é obrigatório, como Vergílio, percorrer as arcadas, mirar o Central, e prosseguir até ao 1/4 para as 9. Fechado!
Uma sopa de cação e um fino, ou imperial, foi o repasto antes da segunda tirada do dia. Mas primeiro, uma ida obrigatória ao Templo, a pé, ao abrigo da sombra, recordando tempo passados na vila romana.
Na moto, como um cavaleiro destemido e sem o casaco da Alpinestars, prossegui a grande velocidade até Alcáçovas. Entre o amarelo da paisagem, da palha seca, de azinheiras plantadas de onde em onde, de porcos na terra e cegonhas no ar, apesar do calor infernal, não vi ponta de fumo; apenas um azul lindo por onde o sol beijava a Terra.
Na vila que ficou reconhecida pelo chocalho, ao passar na loja em que comprei o meu, buzinei e levantei a mão em sinal de cumprimento.
De Alcáçovas a Alcácer do Sal foi outro instante entre as longas rectas e curvas feitas a grande velocidade, até que o Sado se abriu em toda a sua plenitude.
Passada a ponte de ferro, a Ponte Velha assente em carlingas e longarinas, o espelho de água do rio, à direita, e as dunas que nos levam à Comporta, à esquerda. Corvos marinhos, garças, juncos.
O sol deita-se sobre a água e o barco espera-nos em  Tróia.
Lindo este Portugal sem que o fogo o consuma.
A viagem foi rápida, apesar de demorar o dia todo; fi-la a olhar a paisagem, os montes, os riachos, os animais. Sem grande preocupação com fotografias ou em falar com locais.
Foi algo só para mim.







sexta-feira, 12 de agosto de 2016

8.8.16 - Sintra | Cascais

Sintra é uma terra mítica: Byron e Eça escreveram magistralmente sobre ela, encantou Ferreira de Castro e Lou Reed; tem o Lawrence`s na Vila e, lá do alto, espreitam a Pena, os Capuchos, a Regaleira.
Sintra é uma terra de sonho e para quem, como eu, viu o rali de Portugal praticamente desde que nasceu, Sintra é uma terra nostálgica: o ecoar dos motores dos Porsche, Fiat, Audi, Lancia; Röhrl, Toivonen, Blomqvist, Vatanen não seriam quem são se, inevitavelmente, os seus nomes não estivessem igualmente ligados aquele enclave verdejante e rochoso, entre a região saloia e o Oceano Atlântico.
Passado o Autódromo, poucos quilómetros à frente, virei à esquerda para a Lagoa Azul.
Viseira fechada; rotação da Transalp no red line; 5, 4, 3, 2, 1: partida!
Descer a fundo para a Lagoa Azul, aproveitar a estrada toda, fazer trajectória, travar com o punho para, quando inseria a moto na curva, dar um toque com o travão de pé para a fazer escorregar. No "s" direita-esquerda pensei "foi aqui" - e não existe um memorial ou uma simples placa; ervas que crescem na berma e que tentam tapar a memória de um dia que mudou a história do desporto automóvel.
No final da descida, com a barragem do lado direito e garranos do lado esquerdo, foi tempo de embalar a moto porque a subida ia ser longa. O vento soprava no novo NAU N90 entre as 6.000 e as 7.000 rotações; trocar de caixa, mais uma com um grito rouco do metal.
No cruzamento para os Capuchos, entre muros e a floresta de aveleiras e azevinho, mais uma vertiginosa viagem até ao saca-rolhas da Pena.
Sintra pode ser muita coisa e, para mim, é também isto: velocidade.
E foi com velocidade que passei a vila, cheia de turistas e autocarros e tuk tuk; cruzei a serra e fui em busca de outra Sintra: a das praias, das escarpas, de faróis e vista até onde o horizonte alcança.
Nas Maçãs, não as Maçãs que conheci pela pena de Lobo Antunes mas outra bem mais multicultural e popular, entre banhos de água gélida, uma montra cheia de lavagantes e lagostas, bichos de perdição.
Na Praia Grande, uma cena que se repetiu..
Descendo para a Adraga, mesmo a chegar ao minúsculo parque de estacionamento da praia, um caminho pedestre do lado esquerdo apresentou-se como a forma de chegar às praias de Caneiro, Ursa e à maravilhosa vista sobre o Atlântico, lá do alto das escarpas.
Com uma bigtrail, no seu terreno de eleição, foi com facilidade que transpus os quase 2 km de subida entre calhau e pista de areia barrenta.
Lá do alto uma vista de cortar a respiração; com duas cadeiras de plástico deixadas por alguém, para um confortável contemplação.
Com os olhos e a alma repletos, com o sol a baixar do lado direito, foi tempo de fazer a estrada do Cabo da Roca - imortalizada por James Bond - e ver o sol a beijar o mar no Guincho. 
Vale a pena ir. Muito!
Sem emoção e para ficar confortavelmente instalado no Penha Longa ou viver as aventuras do Eça no Lawrence´s... a Agência Paraíso trata de tudo.